Francisco Faria (Curitiba, 1956) é um artista plástico brasileiro que se destaca por seus desenhos feitos com lápis grafite sobre papel, e também com instalações e projetos de criação de arte visual e poesia com a participação de poetas. Os desenhos, frequentemente em grandes dimensões, versam sobre estratégias gráficas e pictóricas do gênero da paisagem, notadamente da paisagem brasileira e da América Meridional.
Francisco recebeu as primeiras noções de desenho aos 4 anos, no Núcleo Juvenil de Artes Plásticas de Curitiba, coordenado pelo pintor Guido Viaro. Na adolescência elege estudar arquitetura pelo vínculo com o desenho. Depois de completar a faculdade de Arquitetura, mostra seus primeiros desenhos artísticos em mostras públicas e recebe os prêmios de aquisição no Salão Paranaense (1982) e no Salão Nacional de Artes Plásticas (1983), e o prêmio de viagem para os EUA da Bienal de Santos (CCBEU- 1984). Em 1982, faz sua primeira exposição individual na sede da Fundação Cultural de Curitiba, com desenhos que articulam correlações entre a construção da linguagem, referências antropológicas e a representação da paisagem. Abandona a profissão de arquitetura e segue para New York, para aprofundar seus estudos de arte. Em NY descobre na paisagem brasileira um tema de interesse universal, e acompanha um grande ciclo de exposições de artistas barrocos do século XVII, como Claude Lorrain e Nicolas Poussin, entre outros, que determinaram a autonomia definitiva do gênero da paisagem nas artes plásticas. De volta ao Brasil em 1986, visita a Jureia, na região preservada da mata atlântica brasileira, momento que terá um impacto duradouro em sua carreira artística.
Em 1986, passa a integrar o grupo de artistas da Galeria Arco (São Paulo), de Bruno Musatti. Sua primeira individidual na galeria, em 1987, apresenta os primeiros núcleos de desenhos das séries do Cabaraquara e Hileias, que determinam o curso de seu trabalho posterior. Pela Arco, mostra na Feira Internacional de Arte de Colônia (1989), marco inicial da participação de galerias brasileiras em feiras internacionais de arte. Realiza sua primeira individual no exterior, na Galeria do Brazilian-American Cultural Institut, em Washington (1º prêmio da Bolsa Fiat para Artes de São Paulo). Vive em Colônia, Estocolmo e Viena, retornando depois para NY. Participa de mostras em Colônia, Basel e Frankfurt pela Galeria Ülrich Gering, onde faz uma individual em 1991. Sobre este primeiro ciclo de trabalhos escreveu Paulo Herkenhoff, curador brasileiro:
“O desenhista Francisco Faria escolheu a paisagem como um tropo do pensamento visual. Seu sistema de laminação da imagem implica a práxis do desenho, as condições materiais do meio a agenciar a história do olho diante da paisagem. Retornando, em alguns projetos, a lugares visitados por viajantes estrangeiros do século XIX, Faria explora a mudança do paradigma do significante paisagístico na cultura contemporânea. [Seu] projeto para uma poética americana presente em seus desenhos, vem com um lastro teórico e histórico bem definido. Um olhar eurocêntrico projetado sobre a América foi sendo gradualmente polido nas fundações de um olhar americano. Não é a questão de simplesmente tomar o âmbito geográfico da América para além do nacionalismo, mas antes a de um deslocamento para um viés processo histórico. O artista sabe que permanecer à margem da História significa permanecer na fronteira do reino produtivo da cultura. Os ameríndios modificaram os europeus em um primeiro contato, e os negros introduziram valores pagãos e bárbaros no monumento barroco europeu na América. A contaminação gradualmente encontrou o seu caminho através dos capilares do tecido social, tecendo uma nova cultura, em um processo permanente. O Desenho fundamental de Faria, através dos olhos erráticos, lavra a excentricidade como categoria. Francisco Faria não só reavalia a história da América, mas a história da cultura ocidental. Ele revisita aquela dúvida em confronto com o real: a paisagem tropical, nos versos americanos, não está em conformidade com os parâmetros de uma Arcádia européia.”
De volta ao Brasil, em 1992, inicia um trabalho conjunto com a poeta e tradutora Josely Vianna Baptista, um work in progress que já dura mais de duas décadas, associando artes plásticas e poesia (com mostras em espaços do Brasil e do exterior e livros editados no Brasil, Estados Unidos, México e Suécia), uma parceria dedicada à construção de um diálogo entre as culturas iberoamericanas e ameríndias e a uma dinâmica criativa entre essas culturas com o mundo natural que lhes dá substância. Realizam um primeiro trabalho conjunto, associando artes plásticas e poesia (Corpografia, SP, Iluminuras, 1992).
Passa a viver com Josely em Curitiba e São Paulo, realizando o segundo trabalho conjunto, a mostra Os poros flóridos. Participa das Bienais Internacionais de São Paulo e de Havana (1994) e da primeira exposição de desenho brasileiro na China, no Yan Huang Art Museum de Beijing (1995). Ainda em 1995, monta o projeto Os poros flóridos no Instituto Wifredo Lam, em Havana, em parceria com Josely e com curadoria de Magda Gonzáles-Mora e Eugenio Valdéz Figueroa. Em 1996 integra a exposição Form und Funktion der Zeichnung Heute, no Kunstverein de Frankfurt, com os 100 mais destacados desenhistas da década, com curadoria de Peter Weiermair. Realiza várias individuais em São Paulo, Curitiba e Florianópolis.
Em 1997 nasce Pedro Jerônimo, filho seu e de Josely, e passam a morar no interior do Paraná. Em 2001 recebe com Josely e com o tradutor Chris Daniels um prêmio do Creative Work Fund de San Francisco em apoio à edição de On the shining screen of the eyelids nos EUA, um projeto baseado no seu trabalho conjunto Os poros flóridos.
Entre 2004 e 2005, desenvolve com Josely o projeto Moradas nômades (com uma sala Fímbrias, com a poesia de Luis Dolhnikoff) que ganha duas grandes mostras individuais, no Museu Oscar Niemeyer de Curitiba e no Instituto Tomie Ohtake de São Paulo. Com o fim da Galeria Arco, passa a trabalhar com a Galeria Virgilio, de São Paulo, expondo individualmente, em abril/maio de 2007, os primeiros desenhos das séries dos Grandes mares, Segundo rio e Paisagem vaga, o ápice de seu primeiro ciclo artístico. Ainda em 2007 é lançado Sol sobre nuvens (São Paulo, Perspectiva, Col. Signos, apresentado pelo poeta Augusto de Campos), que reúne grande parte do trabalho desenvolvido com Josely.
Em 2008 muda-se para Florianópolis, e inicia seu trabalho com a produção de Regina Pinho. Em novembro de 2008, uma mostra com cerca de 40 de seus desenhos é realizada no Hyogo Prefectural Museum of Art, no Japão, com curadoria de Koichi Kawasaki e Tadashi Kobayashi, e produção de Regina Pinho e Deborah Gentil. A mostra no museu criado por Tadao Ando, em Kobe, ocupa uma ala inteira da instituição. Ao voltar do Japão contrai uma infecção nos olhos que interrompe seu trabalho por cerca de 1 ano e no final de 2009 faz sua primeira individual no Rio de Janeiro, na galeria Largo das Artes, com produção de Regina Pinho e reunindo trabalhos essenciais de sua produção nos anos anteriores. Nessa mostra, junto com Josely, realizam um primeiro trabalho poético-visual baseado no ciclo de poemas de Roça Barroca. Em 2011, passando a viver sozinho, é agraciado com um grant da Pollock-Krasner Foundation, de Nova York.
A partir de 2010 passa a fazer parte do núcleo de artistas da Galeria Bolsa de Arte, e inicia um novo ciclo de trabalhos, com a fase mais dinâmica e experimental de seu desenho. Realiza individuais em 2013, na sede da Galeria Bolsa de Arte em Porto Alegre e em 2016, na de São Paulo, onde apresenta as séries dos Grandes polípticos, dos Mares do Levante e das Variações von Martius, um acervo que marca o cume do ciclo mais experimental de seu trabalho.
A representação da paisagem, ao considerar a natureza, pode produzir sugestões plásticas que mesclam tempos diversos, história extensa, memória afetiva e diversidade de espaços. Com isso, permite formalizações dos ideais mais substantivos das vanguardas latino-americanas da modernidade, entre elas as do discurso antropofágico do modernismo brasileiro, e, principalmente, dos conceitos tanto de contraconquista quanto o das eras imaginárias do programa poético do cubano Lezama Lima. É assim que natureza comanda todas as correlações culturais presentes no trabalho do artista, expressas pela observação direta, pela experiência psicogeográfica de deriva por locais que se deixam descobrir ao longo dos caminhos, e que então lhe sugerem, concretamente, a convivência de diversas referências culturais, a possibilidade de uma civilização mais plástica e de uma cultura do êxtase, da beleza e da inclusão.
“Desenvolvendo seu trabalho num estilo clássico, expresso não somente na figuração mas também no desenho virtuoso, Faria viaja com ágil erudição entre diferentes soluções e formas de abordar a Natureza, retorcendo, combinando e desconstruindo essas soluções.” (Agnaldo Farias, em carta à Pollock-Krasner Foundation)
Em 2016 passa a viver com a fotógrafa Paula Molina Echegoyen, no Chile, para desenhar a Araucania, num projeto em que imagina a integração da paisagem continental da América Merdional, que inclui os primeiros desenhos da série das Quimeras araucanas. Começa a produzir o ambicioso projeto das Dryades, com o auxílio de produção do dealer e arquiteto Marcos Bertoldi: uma retomada dos motivos da mata atlântica, do início de sua carreira, agora numa suma estética de seu trabalho em desenhos de grandes dimensões, associando recursos técnicos e experimentais em trabalhos de grande riqueza de detalhes e que dão uma nova dimensão a seu projeto de construção de uma linguagem e de um significado para a paisagem das Américas.
Obras suas estão em acervos permanentes de instituições públicas e privadas do Brasil e do exterior, entre as quais o Museu Oscar Niemeyer (MON), Curitiba / Instituto Nacional de Artes Plásticas, Rio de Janeiro / Coleção Gilberto Chateaubriand, Rio de Janeiro / Fundação Cultural de Curitiba (Paraná, Brasil) / Prefeitura Municipal de Curitiba / Casa José Lezama Lima, Havana, Cuba / Deutsche Bank Collection / Bayer International Collection, Pittsburgh, USA, entre outras.