Aprendendo de uma outra quarentena

Superaguy, Barbados 2, 2009, grafite sobre papel, 150x110cm.

Comecei a série Móbiles logo após um problema nos olhos que me manteve sem ver por quase 8 meses. Durante esse período, pensei continuamente em algumas paisagens que já havia visto um ano antes, em alguns lugares remotos da Baía de Paranaguá. E descobri que minha atenção esteve voltada para algumas características da paisagem, não para todo o panorama. Ainda assim, tive uma ideia geral do panorama que ligava todos os pontos observados em minha memória. Quando voltei aos meus desenhos, comecei a desenhar essas paisagens que persistiam em minha memória, mas me atendo apenas aos pontos lembrados. Os desenhos resultaram em panoramas desconectados de 4 ou 5 pontos soltos e separados no papel. O trabalho foi redefinir harmoniosamente todo o panorama que ligava esses pontos móveis: inventar um panorama para a memória.

Aqui, no segundo desenho da série, as peças esparsas do desenho, as memorizadas, eram o tronco claro da palmeira, a bananeira no centro, a fileira de arvorezinhas frágeis à esquerda e a linha da serra ao fundo. Eu então incluí as outras palmeiras para criar uma diagonal ascendente. No chão fiz uma outra diagonal oposta da direita para a esquerda. As pedras eram uma memória genérica; toda a orla estava cheia delas. Memória e invenção trabalhando ao mesmo tempo e se equilibrando mutuamente. Foi um aprendizado surgido de um outro confinamento.

Francisco Faria

2020-05-07